A realidade brasileira tem contribuindo para a difusão deste tipo de mau humor
Tem gente que é implicante. Acha tudo ruim e coloca defeito em tudo. Quem não conhece uma pessoa assim? Daquelas que, quando pega alguém ou algo pra cristo, é um deus-nos-acuda. Com uma agravante. É maledicente. Fala de tudo e de todos. Conheço uma que prefere voltar sua metralhadora verbal contra os tatuados, como se ainda vivesse nos anos de 1970, quando cobrir a epiderme de desenhos ou frases era raridade. Ao contrário dos dias atuais, em que a raridade é justamente o contrário, especialmente no vasto mundo dos esportes e do entretenimento.
Na rua, ao ver algum tatuado, sempre solta suas alfinetadas (não, sem antes verificar se o criticado está a uma distância razoável para não ser ouvida, pois diz detestar um barraco). Que coisa mais horrorosa, parece um presidiário. Não sei como um pai ou uma mãe pode deixar um filho fazer isso, diz, quando o criticado é um adolescente ou jovem. Se adulto, vai logo afirmando que deve ser bandido ou está maconhado.
Dias desses, ao ler sobre o turismo receptivo no Brasil, mostrando que o país (apesar de abrigar um litoral com mais de oito mil quilômetros de praia, boa parte banhada por águas tépidas, a Amazônia e o Pantanal), recebeu cerca de 5,6 milhões de viajantes em 2017, entre as mais 1 bilhão de pessoas que fizeram algum deslocamento entre países, teve outro ataque.
Quem não conhece uma pessoa assim? Daquelas que, quando pega alguém ou algo pra cristo, é um deus-nos-acuda
Nosso problema é achar que somos os únicos a ter todas estas belezas, o que não é verdade. Há diversas outras plagas tão ou mais belas como cá. E bem menos temerosas, onde é possível ir e vir sem temer um erro do GPS, desembocar num gueto ou favela e ser metralhado sem ao menos ter noção porque está morrendo. Sem contar que os mais de 60 mil assassinatos anuais registrados no país são um cartão-postal nada atraente.
Além disso, continua, em quase todas as cidades brasileiras, com raras exceções, o que impera é o desmazelo. Praças, avenidas, ruas e rodovias entregues ao deus-dará, sem nenhuma manutenção. Museus incendiados por falta de segurança, outros fechados por falta de gente pra cuidar, buracos e alagamentos em dias de chuvas, tudo isso contribui para nos manter distantes dos turistas ávidos por tranquilidade e conforto.
Embora discorde de suas picuinhas, nem em gênero (será ainda que posso escrever esta palavra sem infringir os critérios dos idealizadores da escola sem partido?), nem em número e nem em grau, o fato é que a realidade brasileira (apesar da situação global não ser, assim, um mar de rosas) tem contribuindo para a difusão deste tipo de mau humor.
JAIRO PITOLÉ SANTANA é jornalista em Cuiabá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário