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“A Mãe da Mãe de Sua Mãe e Suas Filhas”, de Maria José Silveira, é uma narrativa sobre a história contada a partir das mulheres brasileiras em sucessivas gerações
Na biologia, o DNA mitocondrial é um composto orgânico presente nas mitocôndrias (organelas celulares), que é passado de mãe para filho na grande maioria dos organismos multicelulares. Os cientistas podem utilizá-lo como instrumento de estudo para traçar a história evolutiva humana e suas rotas migratórias.
Inicio o texto com essa referência científica porque o livro “A Mãe da Mãe de Sua Mãe e Suas Filhas”, da escritora goiana Maria José Silveira, faz uso do conceito de DNA mitocondrial para narrar, de forma romanceada, os mais de 500 anos da história nacional. Isso é feito por intermédio do relato da saga das mães brasileiras e de suas filhas, ao longo dos mais de cinco séculos de existência do País.
O romance tem início com a índia Inaiá, habitante da região de Porto Seguro (BA), perto do Monte Pascoal, no ano de 1500. Passa por 22 gerações de mulheres até chegar, na nova edição (que apresenta um capítulo extra), à Amanda. Essa última, nascida em 2001, no Rio de Janeiro, já cidadã do século 21, período dominado pelas rápidas transformações promovidas pela tecnologia digital.
Da índia tupiniquim Inaiá, que se encantou com Fernão, o grumete português, na época do Descobrimento do Brasil, vão desfilando pelo romance de Maria José Silveira muitas mães (índias, negras, caboclas, mulatas, cafuzas), cujas vidas se desenrolam cronologicamente em momentos distintos da história nacional.
As mulheres do romance testemunham, por exemplo, a era dos engenhos de açúcar, no Nordeste, a invasão holandesa em Recife, a interiorização do país promovida pelos bandeirantes, a Guerra dos Emboabas, a chegada da família real portuguesa em 1808, a Independência, o movimento abolicionista, a proclamação da República, a construção de Brasília, o período da ditadura militar e a redemocratização do Brasil.
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Maria José Silveira: prosadora brasileira
Algumas dessas brasileiras foram felizes, outras viveram o infortúnio, mas todas foram repassando seu legado às suas descendentes (neste romance as protagonistas são muitas, todas mulheres). Elas se casam com europeus, africanos, indígenas e mestiços. E vão contribuindo para tecer a diversidade da qual se compõe o povo brasileiro. Suas famílias se deslocam do litoral para o sertão, das capitais para cidades do interior do País, criando a verdadeira saga nacional.
O leitor acompanha as aventuras e desventuras dessas mães e filhas, que vão se sucedendo rapidamente (nem dá tempo de se apegar a apenas uma figura feminina, logo ela é substituída pela filha ou pela neta). Enquanto isso, os acontecimentos históricos se desenrolam, juntamente com os dramas pessoais e familiares de cada uma delas.
“A Mãe da Mãe de Sua Mãe e Suas Filhas” é um romance acelerado. Nos seus diversos capítulos, as protagonistas apresentam o filme de suas vidas, ao mesmo tempo em que vamos acompanhando as mudanças ocorridas no Brasil — de colônia portuguesa para país independente. No território brasileiro onde vivem as famílias dessas mães, vai sendo forjada a amálgama cultural que contribuiu para a formação dessa grande nação sul-americana, mestiça, multicolorida, cheia de diversidade e culturas.
A autora, nascida em Jaraguá (GO), conseguiu elaborar uma história do Brasil narrada de outra perspectiva: das mães e filhas. Essas bravas brasileiras, de uma forma ou de outra, ajudaram a construir nossa sociedade, com seus anseios, valores, perdas e ganhos. Um romance fácil de ler, recomendado para leitores brasileiros, e também para os estrangeiros.
Mariza Santana, jornalista e crítica literária, é colaboradora do Jornal Opção.
Por Mariza Santana Especial para o Jornal Opção
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