Dados da agência reguladora do setor elétrico mostram 13 conjuntos de fornecimento de energia com baixo desempenho que afetam 358 mil consumidores.
Avenida Perimetral Norte, em Goiânia, sem energia elétrica | Foto: Fernando Leite/Jornal Opção
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As regiões vizinhas a Goiânia sofrem mais vezes e durante mais tempo por falta de energia elétrica do que o restante do usuários de Goiás. Numa lista divulgada permanentemente no site da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), 13 regiões nas redondezas da capital goiana tem desempenhos inferiores ao restante do estado e acima do limite de interrupções estabelecidos pela agência.
Esses conjuntos de fornecimento de energia elétrica atendem uma certa quantidade de consumidores numa região, que pode misturar partes de municípios vizinhos, como por exemplo, a região mais afetada da lista: Nerópolis, próxima a Goiânia.
O município é abastecido, basicamente, por dois conjuntos de fornecimento, o Nerópolis S1 e S2, que atende 22.565 usuários.
Além de Nerópolis, os conjuntos distribuem energia para os municípios Campo Limpo, Nova Veneza, Santo Antonio de Goiás, Anápolis e Pirenópolis.
O conjunto S1 atende 9.770 consumidores, que ficaram 35,40 horas sem energia elétrica, no período de julho de 2018 a junho de 2019.
O limite deste índice, chamado de DEC (Duração Equivalente de Interrupção), que mede o tempo em que um conjunto deixou de fornecer energia, para o S1 era de 13 horas, ou seja, os usuários ficaram 2,6 vezes mais tempo sem energia do que o estipulado pela Aneel.
Outro indicador usado pela Aneel para medir o desempenho das operadoras de energia é o FEC (Frequência Equivalente de Interrupção), que mede quantas vezes a energia deixou de ser fornecida, o famoso “pique de luz”.
Para o conjunto Nerópolis S1, a agência reguladora estipulou 10 interrupções como aceitáveis. Porém, a Enel Goiás deixou de fornecer energia àquele conjunto 20,21 vezes, o dobro do limite.
Mas para compensar essas falhas no serviço, a Enel paga uma compensação aos consumidores, medida de três em três meses, em média, como desconto na conta de luz. Pelas falhas no conjunto S1 de Nerópolis, a operadora goiana desembolsou R$ 274 mil.
O segundo conjunto que fornece energia para Nerópolis, o S2, tem índices parecidos com o S1 e ainda afeta uma quantidade maior de consumidores: 12.795.
O índice de duração da falta de luz neste conjunto ficou em 35,11 horas, enquanto o estabelecido é 13 horas, o mesmo do S1. Quanto a frequência das quedas de luz foram 17,11 para o limite de 10.
A compensação pelas falhas neste segundo conjunto custou R$ 398 mil para a Enel. Os dois conjuntos de Nerópolis deixaram os usuários 70,51 horas sem luz. A Enel pagou R$ 672 mil aos consumidores dos dois conjuntos, em forma de desconto na conta de luz, para compensar os danos.
Na segunda região mais afetada pela falta de luz, a 37 quilômetros de Goiânia, o conjunto de Guapó fornece energia a 14.738 usuários. Este conjunto fornece energia para a cidade e distritos próximos.
A região que recebe energia do conjunto Inhumas S1 engloba 11 cidades, além de Inhumas: Caturaí, Goiânia, Aracu, Caldas Novas, Itaberaí, Itauçú, Taquaral de Goiás, Santa Rosa de Goiás.
Essas cidades ficaram ficou 38,01 horas no escuro, no período de julho de 2018 a junho de 2019, enquanto a meta regulatória era de 19 horas.
A regulação do setor elétrico previa também a média de 15 quedas de luz no período, mas o conjunto falhou 22,31 vezes. Para compensar os danos, a Enel pagou R$ 354 mil aos 13.589 consumidores da região.
O município de Trindade, a 26 quilômetros da capital, aparece entre as cincos cidades em que mais falta luz.
A meta da agência reguladora para o índice DEC (tempo sem luz) era 13 horas, mas a região atendida pelo conjunto de Trindade, que envolve também Goiânia e Abadia de Goiás, ficou 31,46 horas sem eletricidade.
A meta para a quantidade de queda de luz era nove vezes por ano, a Enel intemrrompeu 16,44 vezes para os 39.889 usuários e desembolsou R$ 901 mil no período de um ano.
As cidades Bonfinópolis, Gameleira de Goiás, Goianápolis, Leopoldo de Bulhões, Abadiânia, Silvânia e Terezópolis de Goiás ficaram 27,31 horas sem energia elétrica no período analisado.
A meta regulatória era 18 horas para os 9.819 usuários do conjunto elétrico DAIA S1. A compensação financeira para esses consumidores ficou em R$ 113 mil.
O conjuntos elétricos Cepaigo S1 e S2 fornecem energia para os municípios goianos de Caldazinha, Bela Vista de Goiás, Hidrolândia, Senador Canedo e Leopoldo de Bulhões.
São 17.457 consumidores desses dois geradores que ficaram mais de 30 horas sem luz.
O primeiro conjunto deixou 3.532 usuários por 33,42 horas sem energia e o segundo, 13.925 por 31,14 horas. A met regulatório para os dois conjuntos era de 20 horas.
O conjunto Cepaigo S1 interrompeu o fornecimento de luz 14,51 vezes, acima da meta de 13 vezes. O segundo, Cepaigo S2, ficou abaixo da meta.
As cidades de Abadia de Goiás e Goiânia recebem energia elétrica do conjunto de Carajás, responsável por deixar 76.720 unidades consumidoras sem energia por 18,35 horas, embora a meta regulatória é de 11 horas.
Essa região também sofreu 12,21 quedas de luz; a meta é de oito interrupções. A operadora de energia precisou dar R$ 248 mil em descontos na conta de luz pelas falhas registradas.
O município de Goianira e suas proximidades são atendidas por um único conjunto elétrico, envolve 18.054 consumidores, e ficou acima dos índices da Aneel.
Os usuários tiveram 13,30 quedas de luz, a meta é 10; ficaram 19,52 horas sem luz, enquanto o limite é 13 horas. A compensação financeira para essa região custou R$ 241 mil para a operadora Enel.
O conjunto Independência S1 atende as cidades de Aragoiânia, Aparecida de Goiânia e Goiânia e fornece energia para 48.100 usuários, que ficaram 17,10 horas sem luz, enquanto a Aneel permite até 11 horas.
Essas unidades consumidoras receberam R$ 257 mil em descontos na conta de luz.
Na lista da Aneel, dois grandes conjuntos fornecem energia elétrica para 80.616 moradores de Goiânia e Aparecida de Goiânia.
O Real S1 pode deixar de entregar luz por nove horas para 50.718 consumidores, mas descumpriu a meta da Aneel e interrompeu o fornecimento por 11,35 horas.
O Real S2 deve obedecer o limite de oito horas sem serviço, porém também descumpriu o índice e deixou 29.898 moradores sem luz por 11,53 horas. A compensação financeira pelos descumprimentos custou R$ 469 mil ao caixa da Enel.
Os habitantes de Senador Canedo recebem energia dos conjuntos elétricos de Senado Canedo e Cepaigo S2, também descumpridores dos índices permitidos pela Aneel: 46.424 unidades consumidoras ficaram 14,58 horas sem luz, enquanto o limite regulatório era de 14 horas.
A Enel desembolsou R$ 301 mil para os moradores da cidade. Comerciantes do setor Real Conquista reclamam da falta de luz
A proprietária de uma hamburgueria no setor Real Conquista, em Goiânia, reclama da recorrente falta de luz, que atrapalha o comércio local. Segundo Inês Casagrande, a energia tende a faltar em época chuvosa.
O comércio de Inês funciona em uma parte de sua casa, adaptada ao preparo de sanduíches, principalmente. Como todos os equipamentos da hamburgueira usam energia elétrica, inclusive a chapa de preparo do hambúrguer, quando a luz acaba, os funcionários ficam sem trabalhar.
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A empresária Inês Casagrande perde receita quando deixa de atender clientes por falta de luz | Foto: Arquivo Pessoal
“Atendemos clientes diários e a família depende de boa parte da renda gerada na hamburgueria. Quando falta luz ficamos parados.
E em algumas vezes, com muitos sanduíches em fase de preparo. Então, nesses momentos, optamos por improvisar e ligar a chapa num botijão de gás comum para a loja não parar”, relata a proprietária.
Quando falta energia elétrica no setor Real Conquista, os moradores esperam horas para a concessionária reestabelecer o serviço.
Em média, a espera pela normalização do serviço é de cinco a seis horas, segundo a comerciante. “Tem alguns casos em que a espera é bem menor e chega a alguns minutos só”.
Quando a energia acaba durante o funcionamento da hamburgueria, entre 18h e 24h, a perda financeira pelas desistâncias dos pedidos pode chegar a R$ 200 no dia.
Outro comerciante do setor, Ricardo Moura Bailão, trabalha há 15 anos no ramo de confecção de jeans. Em casa, ele abriu uma confecção há cinco anos.
Com seis máquinas de costura operando diariamente, o comerciante produz cerca de 500 calças jeans por semana.
“Um dia sem luz representa 100 calças jeans a menos na minha produção. O que sobrecarrega os funcionários nos dias seguintes para entregarem a quantidade encomendada.
No meu caso, não compensa comprar um gerador de energia por ser muito caro e a minha demanda ainda ser pequena”, conta Ricardo Moura.
O empresário Ricardo Moura (Direita) possui confecção de calça jeans em Goiânia. As quedas de energia atrapalham a produção diária da empresa | Foto: Arquivo Pessoal
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Para o comerciante, o período de chuva se torna o mais cansativo pelas constantes quedas de energia. “Tento adiantar tudo que posso antes desse período para não ficarmos vários dias parados, se somarmos todas as quedas de luz entre novembro e março, normalmente quando chove muito”, retrata o empresário.
Outro lado
A Enel Distribuição Goiás afirmou ter compromisso com os consumidores de Goiás “e vai continuar trabalhando para a melhora constante da qualidade do fornecimento e atendimento à demanda de energia no Estado”.
Segundo a nota enviada ao Jornal Opção, desde que a empresa francesa assumiu o controle da distribuidora de Goiás em 2017, “após décadas de sub-investimento, a Enel investiu 3,5 vezes mais do que a média anual do período em que era estatal.
Como resultado desses investimentos e do plano de manutenção realizado, o índice de duração das interrupções de energia (DEC) passou de uma média de 32 horas em 2017 para 23 horas em 2019.
A frequência das interrupções de energia (FEC) também foi substancialmente reduzida, passando de 18 vezes em 2017 para 11 vezes em 2019 – os melhores indicadores históricos da companhia. A empresa ressalta, ainda, que está atendendo os limites globais de DEC e FEC estabelecidos pelo contrato de concessão para 2019”.
A Enel destaca que quando assumiu a empresa, ainda segundo a nota de posicionamento, 92% dos 148 conjuntos elétricos estavam com indicadores DEC e FEC acima da meta regulatória. “A empresa acrescenta que está trabalhando na melhoria dos índices de todos os conjuntos elétricos e estamos trabalhando com um plano robusto para recuperar a qualidade e o atendimento o quanto antes”.
Deputado goiano vai denunciar supostas fraudes no balanços da Enel Goiás
O deputado federal José Nelto (Podemos-GO) apurou supostas irregularidades nos balancetes da Enel, operadora francesa de energia elétrica e concessionária da distribuição em Goiás, que serão denunciadas no plenário da Câmara dos Deputados, nesta semana.
O documento com a denúncia será enviado ao Ministério das Minas e Energia, para a reguladora do setor elétrico brasileiro, a Agência Brasileira de Energia Elétrica e ao Governo de Goiás.
O deputado federal José Nelto articula a assinatura de um termo de compromisso para investimentos entre o governo estadual e a Enel | Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
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Segundo a investigação do deputado, a empresa tem contabilizado em seus balanços os investimentos de terceiros, como de produtores rurais na rede elétrica de diversos municípios goianos. “Fica parecendo que a Enel está investindo em Goiás e não está”, dispara o parlamentar.
A empresa também colocou em seus balanços, segundo Nelto, que os pagamentos de geladeiras queimadas, normalmente a título de indenização numa queda de energia, são investimentos na rede de distribuição.
Segundo o deputado, a governadoria de Goiás tenta assinar um termo de compromisso com a Enel que levará a empresa a investir de R$ 3 a R$ 4 bilhões na rede elétrica goiana, no prazo máximo de seis meses após a assinatura.
Caso esse investimento não seja feito, a empresa francesa perderia a concessão em Goiás. Além de não investir na distribuição de energia do Estado, a empresa estaria supostamente enviando os dividendos ao exterior, de acordo com a denúncia do deputado.
O parlamentar afirma que a bancada federal de Goiás na Câmara dos Deputados apoia a iniciativa do governo estadual e articula ainda para que o termo seja assinado o mais breve possível.
A Enel Brasil enviou uma nota sobre as denúncias de José Nelto onde afirma seguir rigorosos padrões éticos e de transparência em suas operações. “Em relação aos investimentos realizados, a distribuidora informa que contabiliza de forma transparente em seu balanço o investimento bruto, feito com aportes da companhia e de terceiros, e o investimento líquido, realizado apenas com recursos próprios”. Sondagem mostra que 80% dos industriais goianos sofreram com falta de luz
Uma sondagem da Federação das Indústriais de Goiás (Fieg), de agosto de 2018, revela que 80% das empresas entrevistadas sofreram com as quedas e falta de energia entre agosto de 2017 a aagostos de 2018.
Dentre essas empresas, as ocorrências são frequentes/eventuais para 65% e raras para 35%, causando prejuízos, sejam eles de alto ou baixo valor. Os prejuízos só não são significativos para 14%, de acordo com a sondagem da Fieg.
Quando as entrevistas foram questionadas sobre o aumento de produção, 45% afirmaram que a falta de energia ou a qualidade são fatores que impactam na decisão de não realizar investimentos nesse sentido.
Para 21% das empresas questioandas não haveria energia suficiente, caso utilizassem 100% da capacidade instalada, diante de outros 79% que confiam na disponibilidade.
Esse índice revela que o maior problema atualmente, de acordo com a sondagem, é a qualidade e não a falta da energia. A utilização média da capacidade instalada variou de 61% a 90% para 55% das empresas que participaram da sondagem. Do total das empresas consultadas, 92% utilizam a hidroeletricidade como fonte principal de energia no processo produtivo, na condição de consumidores cativos, ou seja, que compram energia elétrica da distribuidora local.
Por Rafael Oliveira do Jornal Opção
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